Postado Qui 2 Jun 2011 - 10:47
O fim da pequenez lusitana
Há cinquenta anos o Benfica escrevia a sua primeira página gloriosa na Europa. Onze anos depois de vencer a Taça Latina, o Benfica tornava-se o primeiro clube português a conquistar a Europa.
Até então, as presenças portuguesas na competição tinham ficado muito aquém do desejado. O Sporting tinha conseguido apenas um empate em 1955-56. O FC Porto tinha perdido ambos os jogos em 1956-57. Em 1957-58 o Benfica repetiu o pecúlio do Sporting. Em 1958-59 o Sporting fez história com duas vitórias frente ao ADO da Holanda, mas na ronda seguinte perdeu os dois jogos com o Standard de Liège. Em 1959-60 o FC Porto voltou à velha sina lusitana e perdeu os dois jogos. Os portugueses viviam resignados e felizes com as suas vitórias morais.
Nas cinco edições da Taça dos Campões só tinha havido um vencedor: o Real de Madrid de Puskás, Di Stéfano, Kopa, Santamaria, Gento...
Na Europa dizia-se que não havia contendedores capazes de desafiar domínio do Real, e muito menos no início da edição de 1960-61 havia qualquer expectativa relativamente à carreira dos encarnados.
Tudo começou na Escócia
Quando no dia 20 de Setembro o Benfica venceu em Edimburgo os escoceses do Hearts por 1-2, abrindo assim caminho para a segunda eliminatória, poucos podiam imaginar o que viria pela frente. A verdade é que poucos teriam noção do significado de tal vitória. Olhando a imprensa nacional da época destaca-se o genuíno regozijo com que a primeira vitória de uma equipa portuguesa em solo britânico foi saudada. Talvez porque muitos não acreditassem que a carreira do Benfica durasse muito mais...
Quinze dias depois, em Lisboa, uma nova vitória, agora por 3-0 garantia a passagem à eliminatória seguinte e confirmava a boa imagem deixada na Escócia.
Na segunda eliminatória, uma vitória clara por 6-2 sobre o Újpesti Dózsa no Estádio da Luz deixou o Benfica perto de fazer história e de chegar aos quartos-de-final da competição. Quinze dias depois, na Hungria, um golo de Santana logo aos cinco minutos descansou os lisboetas, que, mesmo permitindo a reviravolta dos magiares na segunda parte, nunca perderam o controlo da eliminatória.
Nos quartos, o Benfica foi bafejado pela sorte. Um sorteio amigo colocou os dinamarqueses do AGF no seu caminho, quando havia ainda em competição os campeões de Espanha, Alemanha, Inglaterra, Checoslováquia e Áustria.
E o Benfica fez história
Na primeira mão, a jogar em casa, as águias venceram apenas por 3-1 quando tinham feito tudo para ir à Dinamarca com um resultado muito mais agradável e seguro.
Mas na partida de volta, em Aarhus, nem a neve atemorizou os portugueses. Com uma exibição segura e cheia de classe, o Benfica saiu da Dinamarca com uma triunfo inequívoco (1-4) e o passaporte para as meias, onde calhou em sorte defrontar os austríacos do Rapid de Viena.
A 26 de Abril, Coluna, Águas e Cavém marcaram os três golos que deixavam o Benfica tão perto do sonho. Mas antes da grande final de Berna ainda havia a segunda mão em Viena.
Foi um jogo duríssimo, com muita luta no relvado do Estádio do Pratter. Ambiente difícil e o Benfica a aguentar a enorme pressão da equipa e dos adeptos austríacos.
Quando Águas marcou o 0-1 aos 66 minutos um silêncio sepulcral atravessou o mítico estádio vienense, mas quatro minutos depois o empate despertou a turba e a ameaça subiu de tom.
«Mosquitos por cordas» na bancada, e a polícia, incapaz de segurar os adeptos, resolve recuar. Os jogadores e dirigentes austríacos incitam a multidão e teme-se o pior.
A dois minutos do fim a invasão de campo torna impossível a continuação do jogo. O árbitro apita para o final e a fúria solta-se nas bancadas. Os desacatos alastram e a equipa do Benfica e o árbitro têm de esconder-se nos balneários, cercados por uma multidão furiosa que tenta forçar a entrada. Após momentos de pânico, a polícia consegue retirar a custo a comitiva benfiquista do estádio.
No fim, alguns pequenos ferimentos e um grande susto, mas nada calava a alegria imensa de um empate que valia primeira final europeia.
A grande final de Berna
Chegado o grande dia, o favoritismo pendia para os catalães que tinham sido a primeira equipa a eliminar o Real Madrid da Taça dos Campeões. Em Berna, na Suíça, Barcelona e Benfica, mais do que uma final europeia jogavam o começo de um novo ciclo.
Os espanhóis entraram decididos a fazer valer o peso das suas estrelas: Czibor, Suárez, Kocsis, Kubala e companhia. Quando Kocsis, após um cruzamento de Luis Suárez, cabeceou para o fundo das redes de Costa Pereira, temeu-se o pior.
Mas o Benfica não se desuniu e chegou ao empate aos 30 minutos, para dois minutos depois um autogolo de Ramallets dar a vantagem aos encarnados. Na segunda parte, um fantástico remate de Coluna, com o pé direito, bem do meio da rua, valeu o 3-1 aos lisboetas. Até ao fim, o Barcelona empurrou o Benfica para trás.
Em Barcelona ainda hoje não se esquecem da trajectória do esférico no estranhíssimo autogolo ou das três caprichosas bolas que bateram nos postes e teimaram em não entrar na baliza de Costa Pereira.
Mas o Benfica não tem culpa que nessa tarde de Berna os deuses da fortuna tenham tomado o seu lado. Mais tarde pagaria, dirão alguns que pagou até com juros altíssimos a sorte de principiante, acumulando azares que fazem lembrar aos adeptos benfiquistas uma famosa maldição...
Há cinquenta anos o Benfica escrevia a sua primeira página gloriosa na Europa. Onze anos depois de vencer a Taça Latina, o Benfica tornava-se o primeiro clube português a conquistar a Europa.
Até então, as presenças portuguesas na competição tinham ficado muito aquém do desejado. O Sporting tinha conseguido apenas um empate em 1955-56. O FC Porto tinha perdido ambos os jogos em 1956-57. Em 1957-58 o Benfica repetiu o pecúlio do Sporting. Em 1958-59 o Sporting fez história com duas vitórias frente ao ADO da Holanda, mas na ronda seguinte perdeu os dois jogos com o Standard de Liège. Em 1959-60 o FC Porto voltou à velha sina lusitana e perdeu os dois jogos. Os portugueses viviam resignados e felizes com as suas vitórias morais.
Nas cinco edições da Taça dos Campões só tinha havido um vencedor: o Real de Madrid de Puskás, Di Stéfano, Kopa, Santamaria, Gento...
Na Europa dizia-se que não havia contendedores capazes de desafiar domínio do Real, e muito menos no início da edição de 1960-61 havia qualquer expectativa relativamente à carreira dos encarnados.
Tudo começou na Escócia
Quando no dia 20 de Setembro o Benfica venceu em Edimburgo os escoceses do Hearts por 1-2, abrindo assim caminho para a segunda eliminatória, poucos podiam imaginar o que viria pela frente. A verdade é que poucos teriam noção do significado de tal vitória. Olhando a imprensa nacional da época destaca-se o genuíno regozijo com que a primeira vitória de uma equipa portuguesa em solo britânico foi saudada. Talvez porque muitos não acreditassem que a carreira do Benfica durasse muito mais...
Quinze dias depois, em Lisboa, uma nova vitória, agora por 3-0 garantia a passagem à eliminatória seguinte e confirmava a boa imagem deixada na Escócia.
Na segunda eliminatória, uma vitória clara por 6-2 sobre o Újpesti Dózsa no Estádio da Luz deixou o Benfica perto de fazer história e de chegar aos quartos-de-final da competição. Quinze dias depois, na Hungria, um golo de Santana logo aos cinco minutos descansou os lisboetas, que, mesmo permitindo a reviravolta dos magiares na segunda parte, nunca perderam o controlo da eliminatória.
Nos quartos, o Benfica foi bafejado pela sorte. Um sorteio amigo colocou os dinamarqueses do AGF no seu caminho, quando havia ainda em competição os campeões de Espanha, Alemanha, Inglaterra, Checoslováquia e Áustria.
E o Benfica fez história
Na primeira mão, a jogar em casa, as águias venceram apenas por 3-1 quando tinham feito tudo para ir à Dinamarca com um resultado muito mais agradável e seguro.
Mas na partida de volta, em Aarhus, nem a neve atemorizou os portugueses. Com uma exibição segura e cheia de classe, o Benfica saiu da Dinamarca com uma triunfo inequívoco (1-4) e o passaporte para as meias, onde calhou em sorte defrontar os austríacos do Rapid de Viena.
A 26 de Abril, Coluna, Águas e Cavém marcaram os três golos que deixavam o Benfica tão perto do sonho. Mas antes da grande final de Berna ainda havia a segunda mão em Viena.
Foi um jogo duríssimo, com muita luta no relvado do Estádio do Pratter. Ambiente difícil e o Benfica a aguentar a enorme pressão da equipa e dos adeptos austríacos.
Quando Águas marcou o 0-1 aos 66 minutos um silêncio sepulcral atravessou o mítico estádio vienense, mas quatro minutos depois o empate despertou a turba e a ameaça subiu de tom.
«Mosquitos por cordas» na bancada, e a polícia, incapaz de segurar os adeptos, resolve recuar. Os jogadores e dirigentes austríacos incitam a multidão e teme-se o pior.
A dois minutos do fim a invasão de campo torna impossível a continuação do jogo. O árbitro apita para o final e a fúria solta-se nas bancadas. Os desacatos alastram e a equipa do Benfica e o árbitro têm de esconder-se nos balneários, cercados por uma multidão furiosa que tenta forçar a entrada. Após momentos de pânico, a polícia consegue retirar a custo a comitiva benfiquista do estádio.
No fim, alguns pequenos ferimentos e um grande susto, mas nada calava a alegria imensa de um empate que valia primeira final europeia.
A grande final de Berna
Chegado o grande dia, o favoritismo pendia para os catalães que tinham sido a primeira equipa a eliminar o Real Madrid da Taça dos Campeões. Em Berna, na Suíça, Barcelona e Benfica, mais do que uma final europeia jogavam o começo de um novo ciclo.
Os espanhóis entraram decididos a fazer valer o peso das suas estrelas: Czibor, Suárez, Kocsis, Kubala e companhia. Quando Kocsis, após um cruzamento de Luis Suárez, cabeceou para o fundo das redes de Costa Pereira, temeu-se o pior.
Mas o Benfica não se desuniu e chegou ao empate aos 30 minutos, para dois minutos depois um autogolo de Ramallets dar a vantagem aos encarnados. Na segunda parte, um fantástico remate de Coluna, com o pé direito, bem do meio da rua, valeu o 3-1 aos lisboetas. Até ao fim, o Barcelona empurrou o Benfica para trás.
Em Barcelona ainda hoje não se esquecem da trajectória do esférico no estranhíssimo autogolo ou das três caprichosas bolas que bateram nos postes e teimaram em não entrar na baliza de Costa Pereira.
Mas o Benfica não tem culpa que nessa tarde de Berna os deuses da fortuna tenham tomado o seu lado. Mais tarde pagaria, dirão alguns que pagou até com juros altíssimos a sorte de principiante, acumulando azares que fazem lembrar aos adeptos benfiquistas uma famosa maldição...